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    A rápida ampliação de seu espaço é demonstrada pela promulgação da lei nº 151, de 19 de fevereiro de 1913, autorizando o prefeito a comprar uma área para o aumento do cemitério.

   A área incorporada deveria ser contínua e de mesmo tamanho daquela em que o cemitério estava localizado e em torno dela haveria um muro para cuja construção o prefeito solicitava aprovação de crédito extra, como consta do artigo 2º da mesma lei ( Leis da CMSB; 1914: 164 ).

 

   Outra ampliação desse cemitério consta do prefeito Saladino Cardoso Franco de 1919, pelo que se justificava o excesso de despesa verificado na verba “Cemitérios”, pelo fato de ter sido adquirido o terreno necessário, além da realização de outros trabalhos. O prefeito informa terem sedo gastos (13 contos, 704 mil e 530 réis) o que elevou o preço do custo do cemitério a (22 contos, 119 mil e130 réis). Saladino sublinhava a impossibilidade do adiantamento de tais trabalhos, o que se comprovava informando a falta “absoluta” de espaço para mais sepultamentos ( Relatório do Prefeito Municipal; 1920: 8). Uma outra aquisição de terreno para aumento do cemitério de santo André consta de uma correspondência do mesmo prefeito à Câmara, em 30 de março de 1922.

 

    O terreno de aproximadamente 18.ooom² pertencia ao Cel. Alfredo Fláquer e foi adquirido por  ( 3 contos e 800 mil réis) no dia daquele mês. Considerando como imprescindível tal aquisição, o prefeito solicitava, além da aprovação da compra, a abertura de crédito suplementar à verba destinada aos cemitérios para que pudesse saldar dívidas. O pedido foi aprovado no dia primeiro do mês seguinte (FCMSB; S16-M9).   

   Do relatório elaborado pelo mesmo prefeito para o exercício de 1928 constam a construção dos muros e a valorização dada à área de terreno contígua ao Cemitério Municipal de Santo André, colocando-se o valor de 76 contos e 200 mil réis ( Relatório do Prefeito Municipal; 1929: 18-19).

 

    Pode-se, a partir disso, relacionar o aumento do espaço e as mudanças na infraestrutura do cemitério de Santo André, não apenas ao fato de ter sido este, por bastante tempo, o único existente no distrito, mas sobretudo às necessidades de higienização e saúde públicas, então vigentes. A lei nº 252, de 20 de dezembro de 1926, que organizava os serviços da prefeitura, deixava a cargo da Inspetoria Sanitária os serviços nos cemitérios municipais – pelo parágrafo único do artigo 2º. Essa lei visava a remodelação das diversas repartições públicas municipais, o que a Câmara colocava como decorrência da rápida evolução do município. Havia ainda, requisição de um zelador para o cemitério de Santo André (FCMSB; S12-M1).

 

     A SOLICITAÇÃO DO PREFEITO Saladino em 1919 – exposta acima - , para o aumento desse cemitério, pode ter sido necessária em face dos óbitos ocorridos com a epidemia da gripe apontada no relatório do prefeito, relativo ao ano de 1918, em que também aparecem os números referentes a mesma:  tendo causado um total de 8790 pessoas infectadas, ou seja, um quarto da população total de 30.000 habitantes do município de São Bernardo – segundo dados do próprio prefeito - , no distrito de Santo André gerou um obituário de 43 indivíduos, para um total de 2800 infectados ( Relatório do Prefeito Municipal; 1919: 16-17).

 

    Com base na população do distrito de Santo André, no ano de 1920, como sendo de 7.036 pessoas ( Relatório do Prefeito; 1921), de que deveria estar próximo o total da população desse mesmo distrito em 1918, aqueles dados possibilitam perceber que, embora o número de mortos (43) tenha sido relativamente pequeno – o que sugere uma relativa eficácia no tratamento - , o alto número de pessoas infectadas (2800) durante a primeira epidemia revela, no entanto, a precariedade da infra-estrutura sanitária do período. Portanto, a falha na prevenção das doenças gerava mobilização por parte de setores da sociedade civil para que fossem supridas as necessidades sanitárias do município, como é ilustrado pelos casos já citados sobre os cemitérios de Ribeirão Pires e de Rio Grande.

 

O já citado cemitério dos bexiguentos, tendo funcionado entre 1850 e 1888 ( de que há referência em escrituras de 1850 e 1860 e em livros de óbito de 1888 – SANTOS; 1992:154) , pode ser analisado sob este prisma da saúde pública, pois a exclusividade atribuída ao mesmo com relação ao sepultamento de variolosos remete-nos à idéia de que princípios higienistas poderiam ter fundamentado a iniciativa de seu isolamento, já que foi construído em um local afastado das áreas de maior adensamento e circulação populacionais da Estação de São Bernardo. Tratava-se, de qualquer forma, de um caso isolado, sendo que tais princípios só viriam a ser priorizados, no município de São Bernardo, a partir da década de 1920.

 

O panorama de crescimento e aglomeração populacional, característico das primeiras décadas do século XX na região do atual Grande ABC, pode ser relacionado a uma medida referente à higienização pública, tomada no ano de 1928 pelo prefeito Saladino Cardoso Franco. Tal medida consistia na construção de um necrotério no cemitério de Santo André (Relatório do Prefeito Municipal; 1929:33). Essa construção havia sido solicitada no ano anterior, pelo mesmo prefeito à Câmara Municipal, com o apontamento de que a autópsia feita a céu aberto e mesmo a ausência de um lugar em que os cadáveres pudessem alojar-se até a realização da mesma eram grande risco para a saúde pública (Idem; 1928).

 

     Provavelmente com o intuito de comprovar a gravidade da situação, o prefeito acrescenta o dado de que, dos 864 óbitos ocorridos naquele ano em todo o município de São Bernardo, 338, ou seja, quase a metade, haviam ocorrido em Santo André (Idem; 1929: 39). Há que se lembrar que, em 1926, a Inspetoria Sanitária assumiu os serviços nos cemitérios do município, o que leva a crer que a solicitação do prefeito para a construção do necrotério possa ter partido de uma pressão da mesma sobre o poder municipal.

 

    Na década de 1920, portanto, a questão da prevenção das epidemias passa a envolver a condição dos cemitérios, que começam a ser encarados pelo poder público municipal, sob o prisma da saúde pública, como grandes focos de infecções caso não fossem devidamente estruturados. É possível perceber o aumento gradual da preocupação com a prevenção e não apenas com o tratamento das doenças, sobretudo as epidêmicas. Sendo assim, o papel desses espaços passa a extrapolar o âmbito religioso em função dos princípios de higiene, símbolos do projeto de modernização do país no período.

 

     Diante disso, nada mais sensato, na visão das várias instâncias do poder público, do que assumir a organização do funcionamento dos cemitérios em detrimento das Igrejas e Irmandades que até então haviam sido responsáveis pelos mesmos. O objetivo era a melhoria das condições públicas de higiene para garantir a imagem ordenada e asseada dos espaços públicos, difundindo-se uma imagem saudável.

 

Percebe-se então, que a religiosidade que permeou o significado de funcionamento dos cemitérios da região do ABC durante todo século XIX e o início do XX passa ao segundo plano e, num movimento amplo de laicização, é o papel prático dos cemitérios que passa a predominar, a partir da década de 1930, em uma atmosfera de civilidade e modernização que o regime republicano pretendia promover no país e que se consolidaria nas décadas seguintes.

 

     *Pesquisa e texto desenvolvidos sob orientação de Suzana Cecília Kleeb, historiadora do Museu de santo André.

 

      Bibliografia:

 

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Castilho, José C.: as margens do caminho; tese; 1995

Etchebéhère Jt., Lincoln: “ O morrer em São Paulo no SéculoXIX”, in: Revista Histórica; Arquivo do Estado de São Paulo, Imprensa Oficial; set. a nov. de 2003

Passareli, Silvia H.: “ Sobre a Vila de Paranapiacaba “; in: Ferreira, João.

Passareli, Silvia H., Santos, Marco Antônio P.; Paranapiacaba- Estudo e Memória; santo André: PMSA; 1990.

Fundo Câmara Municipal de São Bernardo (FCMSB0) : S5-M6; S9-M3 S12-M1; S15-M1 S16-M17 e M9;  S18-M1.

Gaiarsa, Otaviano A: A cidade que dormiu três Séculos: Santo André da Borda do Campo – seus Primórdios e sua evolução Histórica; Tipografia Bandeirante; Santo André: PMSA; 1968

Lacorte, Holando: Memória de um Andreense; Ed. Soma, São Paulo; 1985

Leis Decretadas pela Câmara Municipal de São Bernardo; São Paulo, Tipografia Siqueira, Nagel e Cia; 1914

Loduca, Wilson: São Caetano – de Várzeas Alagadiças a “Príncipe dos Municípios” , São Paulo: Hucitec; são Caetano do Sul: PMSCS,1999.

Martins, José de Souza: Diário de Fim de Século; Fundação Pró-Memória, São Caetano do sul; 1998

Martins, José de Souza: Subúrbio – Vida Cotidiana e História no Subúrbio da Cidade de São Paulo: São Caetano, do fim do Império ao fim da República Velha. São Paulo: Hucitec; São Caetano do Sul: PMSCS; 1992.

Relatórios de Prefeitos Municipais de São Bernardo: 1910;1911;1919;1921;1928;1929.

Santos, Wanderley dos: Antecedentes Históricos do ABC Paulista – 1550/1892; São Bernardo: PNSBC, SECE, Dep. De Cultura; 1992.

Revista “Viva Cidade”, Santo André: PMSA – Coordenadoria de Planejamento.

 

*Juliana Maria de Carvalho – Graduada em História pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, FFLCH – USP, estagiária de História no Museu de Anto André.

 

 

 

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